Sempre que viajo tenho a sensação ou impressão – certeza, certamente – de estar esquecendo algo. Tanto quanto a deixar, como quanto a fazer. A conta não paga, o compromisso perdido, a janela aberta, a porta sem tranca, de estar trazendo a mala com a roupa inadequada, calçado descombinado, o livro, a bolsa de noite, o perfume errados. Sair de casa é deixar a casa em casa. Não tem como estar com tudo.
Sacanagem da viagem: você entra no avião, passa pela Primeira Classe. Sorri. Passa pela Classe Executiva. Que alívio! E chega na Classe Econômica. Pânico da realidade de não poder voltar atrás – nem pra trás. O jeito é encarar o Navio Negreiro da Classe Econômica. No fim das contas todos chegaremos lá.
Começo a me sentir estrangeira ainda com o avião em solo. À minha volta, as palavras já são internacionais. Viajo nelas.
Mochila nova é uma perdição. Enquanto cada coisa não encontrar seu bolso ou repartição, tudo se perde. No abrir e fechar de zíperes perco-me de mim mesma. Cadê o passaporte, os óculos, o remédio, a caneta, o casaco … ????
Se eu fosse americana, seria uma mórbida feliz e obesa. Muffins com mirtilos, framboesas, avelãs e chocolate. Mix de tudo que é bom. M&M + amendoim e amêndoas torradas e salgadas + uvas passas. Waffel feito na hora: crispi matinal com cream cheese e siroup. Uma lista de novos favoritos descobertos em qualquer prateleira à qualquer hora e lugar. Jeans apertados. Curvas e saliências inesperadas e novas. Felizmente, o período americano será curto pra consequências mais sérias.
Viajar em grupo é bom e ruim. Viajar a dois é bom e ruim. Por isso, às vezes escapo de todos e fico comigo mesma.
Navio e avião são perfeitos quando operam em cruzeiro. Quando inventam de cavalgar ondas e surfar nuvens é um “Deus nos acuda”. Fico sempre de olho na linha do horizonte. O olhar dá o controle que o corpo perde. Quando não, Dramin nele.
Depois de uma semana me transformo na perfeita turista. Por mais que me esforce é hora de repetir roupas, fazer novas combinações com o que a mala não engoliu, com o que está limpo e apresentável e menos amassado. O excesso de informação turva o bom gosto e a criatividade. Apenas me visto com a disponibilidade, me misturo na multidão e descubro a beleza do improviso. A transformação se completa.
Ficar fora do ar – por dias ou semanas – sem notícias, sem celular e internet tornou-se uma aventura radical. Poucos se atrevem ao isolamento e à alienação. Poucos conseguem. Conexão é o meio de transporte para este tipo de viagem. Desconectar-se, a grande aventura.