“… bênçãos e desgraças vem sempre no horário …”
“o tempo entre o sopro e o apagar da vela”
“achar a porta que esqueceram de fechar.
o beco com saída.
a porta sem chave.
a vida.”
O que gostei de Leminski. Até agora. O livro de capa laranja e bigode avantajado se perde nas dobras do edredon de pelúcia em tons de verde xadrez, nas noites geladas da minha convalescência. Insisto em lê-lo. Poesia ainda me é um gênero intuitivo e passional. Tenho de sentir na pele, no fígado. Aprendi a gostar de Mário Quintana. Hoje, não vivo sem um na minha cabeceira. Tem arte que simplesmente cola na gente, se impregna, encontra um contraponto num ponto que a gente nem sabe que tem. Nina Haggen cantava em russo coisas que eu me arrepiava toda. E não entendia nada. Mia Couto usa expressões que nunca ouvi mas sinto fundo o que ele diz, mesmo sem saber. Adoro Miró, suas cores e curvas e desenhos infantis. São quase meus, pois queria que fossem, e quando leio o que ele quis representar com sua obra percebo que não entendi nada daquilo, mas o que entendi, me basta. Já Picasso, seu cubismo, suas pontas e linhas me soam geladas e distantes. Aprecio-o apenas como arte. Leminski tem sido assim. Distante e desconexo.
“quando eu tiver setenta anos
então vai acabar esta adolescência
vou largar da vida louca
e terminar minha livre-docência
vou fazer o que meu pai quer
começar a vida com passo perfeito
Vou fazer o que minha mãe deseja
aproveitar as oportunidades
de virar um pilar da sociedade
e terminar meu curso de direito
então ver tudo em sã consciência
quando acabar esta adolescência”
Opa! Mais um poema de Leminski com contraponto. Imagino qual o ponto adolescente na minha poesia!