A quinzena

Os dias passam, e cada vez mais, o cansaço me alcança. As pernas doem, a coluna reclama, os braços recusam a carga. Se me perguntarem o que quero, eu quero é dormir. Olhar TV desanima: só notícia ruim (é a COVID19, é a política, a corrupção, a inescrupulosa humanidade que tanto maltrata a natureza, os animais e seus semelhantes). Só notícia ruim. 

Duas semanas atrás me embrenhei, impetuosamente, no meu refúgio no RS. Precisava de silêncio, paz, sossego, leitura, música clássica, silêncio, a cama. O silêncio. O silêncio. Basicamente o silêncio. Era tudo o que eu queria. Me joguei na cama assim que cheguei. E lá fiquei por dois dias. 

Devagar fiz contato com o mundo, via telefone convencional, que aliás, pretendo manter.  Ele dá a medida perfeita da distância necessária pra me manter inteira. Aos poucos, dei sinal de vida e me coloquei à disposição. E cá estou eu, descarrilada de novo. Ao dizer “queres que providencie algo por aqui?” desabei ladeira abaixo: contratei um pintor e aluguei minha casa.  Meu refúgio, meu Xangrilá. Não tinha como não descarrilar!!!! Nem sempre o melhor ou o pior é o que nos deixa mais felizes. Muitas vezes é necessário agir, mudar, seguir em frente, desapegar.

A casa estava à venda há um bom tempo. E por mim ficaria assim ainda por um bom tempo … mas, andava cansada até do meu refúgio. Por isso, quando apareceram dois interessados – Ricardo e Marlon – para alugar, com possibilidade de venda futura, decidimos arriscar. Optamos por Ricardo. Imagina a viagem que foi preparar a casa de 27 anos, pra render uns trocos, reduzir o trabalho e praticar o desapego. Uma correria insana entre discussões contra e a favor de “isso joga fora”, “vou levar pra casa da minha mãe”, “vou levar pra Floripa”, “melhor deixar na casa”. Foi um leva e traz, empacota, contrata caminhão, acomoda apegos … enfim, fiz a minha parte e retornei à Floripa. 

Neste meio tempo, um acidente horrível, com a explosão de um caminhão carregado de combustível, interditou a ponte e atrapalhou enormemente minha rotina e de toda a cidade; aproveitei a volta pra Floripa e adiantei o implante dentário; chegando em casa, a triste notícia de que um pit bul mordeu o rosto da filha de 2 anos da minha assistente doméstica, ambas internadas. Me joguei na cama de novo. Cansada, aflita e revoltada.

Passados dois dias da minha chegada, ainda não descarreguei o carro. Tenho lido e escrito pouco. Comi todos os doces que encontrei pela casa + o proibidíssimo amendoim torrado = ansiedade máxima. Me refugiei no jogo de paciência Spider Solitarie no computador e nas mídias sociais.

É sábado e a ideia de caminhar na praia, tomar sol e retomar a organização da casa não vai acontecer. Acordei cedo demais – com o barulho da bomba de rebaixamento do lençol freático da obra da casa do vizinho.

Preparei meu coquetel de “levantar defunto”: vitaminas e antidepressivo. Para os sintomas, remédios.

O resto, o tempo ajeita. Tenho aprendido a me dar tempo e respeitar meu tempo. 

O consultório vai bem e ele me faz muito bem.

Assim como eu, tudo tem seu tempo. 

Há de chegar a hora em que o viver será mais brando.

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