Como eu amo este lugar

Amo a tranquilidade deste lugar,

dos gorjeios dos pássaros, de todos os tipos, 

que circundam e invadem a casa por todos os cantos;

dos gatos, senhores de si, donos desta casa sem dono presente.

São eles que fazem a ronda e descansam debaixo das cicas, das fênix, 

em meio e rodeados da mandala de sol.

As orquídeas, as bananas e as jabuticabas, e agora as pokan,

crescem a Deus dará. Enchem de vida este lugar.

Aos poucos a casa fica com jeito de casa:

Vou arrebanhando móveis antigos e desgastados

Envolvo-os de sonhos de um amanhã cheio de vida e alegria.

O silêncio e a solidão são amigas sempre bem-vindas,

sempre presentes. Dispensamos o lado de fora da cerca.

O dentro se basta e se completa.

Com elas – a solidão e o silêncio – me preencho,

 e sei, elas vivem sossegadamente nesta casa.

Também sei o quanto elas amam a chegada destes abandonos e farrapos.

Somos todas a alma desta casa.

Estropiadas, sucateadas, esquecidas.

Todas, ganhamos vida neste lugar.

É por isso que sempre volto.

Até chegar o dia de cravar raízes,

feito os kaizucas que ladeiam a casa,

ou os plátanos que a margeiam.

A loucura do amor

Você que me assassinou de todas as formas possíveis; Apunhalou meu coração, fuzilou-me infielmente. Estrangulou minhas palavras, sufocou minha alegria, dinamitou meu amor próprio, ridicularizou meu eu. Me fulminou inteira, sem deixar traços nem rastros.

Te amo, te odeio.

Me larga, me afasta.

Vá.

Esqueça-te de mim.

Perdoa-me. Prenda-me.

Sei que não me mereço.

Volte.

Me tome inteira.

Me mate de tanto me amar.

E vá. Vá sempre. Vá.

Mas jamais, jamais esqueça de voltar.

Esta sim, seria a mais violenta e perversa de todas as loucuras.

cochichos

não sei se abraço a vida ou a morte.

a morte acena cheia de facilidades e finalizações.

xeque mate. ponto final.

já a vida,

impõe sacrifícios e compensações.

um ainda em constante processo.

– o próximo. o seguinte. mais uma, outra vez –

ando tão farta de me exigir e me infligir

perfeição, decepção, dor.

a morte funga meu cangote,

cochicha outras vidas.

na pele

vontade de arrancar a própria pele e me vestir outra.

sair deste corpo que aperta. estrangula e sufoca.

um corpo que não me serve, nem me define mais.

ruiu, virou pó. espatifou.

me esmigalhei inteira.

sumo em frestas feito água. feito pó.

sem forma, sem contorno. líquida. invisível.

essa não sou eu.

diluída, me agarro aos sonhos de menina,

aos projetos de mulher madura, à falta de sentido.

meu medo é escorrer, me misturar ao lodo à minha volta,

e perder de vez qualquer fio de lembrança

  • ou esperança –

do que um dia fui ou imaginei ser.

o que vivi pensando que era nosso,

era apenas meu.

a tua verdade, era somente tua.

jamais nossa.

vivemos a dois, sendo cada um, um.

o tempo todo. quase a vida inteira.

minha verdade é

– e sempre será –

todo meu mundo.

um mundo somente meu.

uma verdade – queria eu – fosse completamente nossa.

A ilusão do amor

Da ideia do amor.

Do engano que é o amar iludido.

Amar é bom demais. Desamar acorda o ódio.

Amar é delirar, alucinar e perder –se de si mesma, da verdade, da razão.

Acordar desta insanidade é pulo e queda vertiginosa sem escalas, misericórdia e compaixão

na depressão, no desencanto, na dor.

É espatifar-se. Quebrar-se inteira.

Pra depois, logo depois … Louca para amar.

Mais uma vez. Só mais uma vez. Uma vez mais.

Se esborrachar de novo.

Eterna apaixonada pela ideia do amor.

Sedenta pelo prazer de amar.

Amar e ser feliz.

Contabilidade afetiva

Desta vez, decidi não deixar de graça.

Nada de descontos,

Nem de suaves e intermináveis prestações a perder de vista.

Desta vez, será à vista

Com direito a juros estratosféricos

e correção monetária astronômica.

Mesmo assim, e tens de reconhecer, o preço será justo.

Nada de pechincha, nada de promoção.

Não é o caso, muito menos a situação.

Amor, fidelidade, lealdade, companheirismo, intimidade …

Tudo, absolutamente tudo que faz a vida a dois valer à pena ser vivida

Carece de taxas e tarifas.

Não existe valor

Não existe preço

Não existe parâmetro

Pra dimensionar

Nem o amor,

Nem a dor de um coração partido

Fulminado, dilacerado.

Haja colhões pra suportar golpes baixos.

Eu tive.

Mesmo agora,

estraçalhada em caquinhos e despedaçada,

tento desesperadamente

encontrar um jeito de somar e multiplicar o amor.

Será que tudo isso vale tanto à pena?

Amores

Já amei demais. Odiei outro tanto.

O amor é leve.

O ódio pesa.

Boiar é preciso.

A vida – generosa – ensina.

Asnos e asnas – asas – não aprendem.

Voam e se extraviam.

Amores tem persona própria.

Amor de macho e fêmea. Uno.

Amor pa-maternal. Ático do universo.

O amor fraterno

– frágil, brando, permissivo, liberal –

Sucumbe e dilacera.

Sabe que se recupera.

Tem o tempo de todas as vidas.

Saudades dos amigos de infância.

Amores são veludos incrustrados de pedras preciosas,

 doídos por alfinetes esquecidos nos alinhavos.

Todas formas de amor

Um dia deprê, uma terça cinzenta e barulhenta convida a um filminho na tevê. Ovos, salsichas e suco light de manga na bandeja, sofá ao meio-dia, controle remoto na mão e eis que me deparo com um filme adorável e deprimente. Toda forma de amor é a matéria prima e o próprio filme. Do amor hétero – aos animais, arte, natureza, vida – ao homossexual. O amor como causa maior e como história de uma vida e de um tempo.

Depois do filme, um giro pela cidade: caminhada no parque com direito a show de águas e agapantos em flor, mercado e farmácia. Quando volto do sul passo por um período de aclimatação à metrópole. O mesmo acontece quando vou de SP ao RS. Algo como jet leg emocional. Depois de uns dias, passa.