Perdão

Quando lembro  

do que vivi; 

do que me aconteceu;

do que aconteceu aos outros;

do que tive de suportar;

do que tive de engolir;

do que tive de fugir;

do que permiti que fizessem comigo;

do que senti;

do que menti pra mim mesma;

do que menti para os outros.

Lembro 

da coragem que me abandonou,

do medo que me paralisou,

da vergonha que senti,

da indecisão que me confundiu,

da desesperança que me invadiu,

do ódio que ainda hoje me aleija e que me faz lembrar, 

de tempos em tempos, 

do que eu poderia ser ou ter sido. Quem sabe algum dia, ainda serei.

Quem sabe neste dia, quando olhar para trás,

entenda que tudo que aconteceu, tinha de acontecer.

E que do meu jeito, 

fiz o que pude de melhor.

Sem críticas. Sem comiseração. Sem culpa.

Por enquanto, 

deslembrar me desmembrando tem sido o caminho.

Minha verdade e vida.

Que meus filhos entendam e me perdoem.

Pois, jamais me perdoarei. 

Não existe perdão pra tamanha hesitação.

Aprendendo com os outros

Existe um ditado alemão que diz mais ou menos o seguinte: esperto é aquele que aprende com os erros dos outros, inteligente é aquele que aprende com os próprios erros e burro é aquele que não aprende nem com os próprios erros nem com os erros dos outros. Já fui esperta, inteligente e burra. Tenho tentado ser o mais esperta e inteligente possível. Quando insisto naqueles erros inadmissíveis, dando uma de burra, me consolo dizendo que foi por causa da minha teimosia taurina ou culpa da minha determinação alemã. Não que isso diminua o impacto ou o estrago do erro, mas poupa minha autoestima, a esta altura sensivelmente abalada. Aprendi com meus próprios erros que devo sempre: acreditar em mim, na minha capacidade, intuição e instintos; evitar tomar qualquer atitude radical por impulso; ouvir uma segunda, terceira, quarta … opiniões médicas quando desconfio do diagnóstico ou do tratamento; evitar sair às compras quando estou de mal comigo/mundo; desconfiar quando um produto é muito barato; aceitar minha paixão à primeira vista por alguém ou coisa; prestar atenção aos limites do meu corpo; dormir 8 horas por dia; comer exatamente aquilo que estou com vontade de comer; tomar cuidado com as roupas listradas, justas ou de tamanho menor que o meu; usar calcinhas com foro de algodão; ter sempre na bolsa um remédio pra enxaqueca e cólica; evitar ter estoque de balas, chocolates ou sorvete em casa … Aprendi com os erros dos outros que preciso dar atenção e conversar freqüentemente com filhos, familiares e amigos; que o divórcio machuca demais; não devo gastar mais do que ganho ou tenho; não devo dar ouvidos às fofocas; preciso ser atriz da minha vida e não expectadora da vida dos outros; preciso avaliar muito bem para quem emprestar dinheiro; ser fiador apenas para pais ou filhos; não fumar jamais; não beber demais, não comer demais, não trabalhar demais; devo lutar com unhas e dentes pelo amor da minha vida; nunca usar de chantagem e violência com quem amo; ser a maior responsável pela minha felicidade; sempre acreditar naquilo que aprendi com a vida e comigo mesma … Ainda não aprendi a falar inglês e espanhol fluentemente; lavar louça enquanto  cozinho; usar religiosamente os cremes prescritos pela dermatologista; beber menos café; comer menos doces; “armar barraco”, “rodar a baiana”, “subir nas tamancas”, ou seja, “botar a boca no trombone” … Possivelmente estou esquecendo de muitas coisas que aprendi de um jeito ou de outro ou que ainda não aprendi. Muitos dos nossos erros/aprendizados são uma escolha pessoal. Aprendemos na prática aquilo que já sabíamos da prática dos outros. Ousamos e insistimos em tentar do nosso jeito, acreditando que pode dar certo ou não, nos boicotamos, fazemos gol contra e nos prejudicamos, consciente/inconscientemente. Parece que não queremos aprender, não queremos acertar. Por quê? Saber a serviço do que estão nossos acertos e erros pode nos indicar o lugar onde queremos chegar! Como queremos chegar! Com quem queremos estar!

                                                     Los Canales, setembro de 2006.