Psicodinâmica Escolar

A escola tem papel importantíssimo no aprendizado e desenvolvimento global da criança e do adolescente. Quando a criança ou o adolescente chegam à escola, além dos aspectos constitucionais e vivências familiares, outro fator importante para seu processo da aprendizagem e desenvolvimento pessoal é o ambiente escolar em que ela se encontra.

Portanto o tripé do processo de aprendizagem é formado por 3 elementos:

  1. Aspectos Constitucionais individuais;
  2. Vínculos Familiares;
  3. Ambiente escolar.

As escolas são instituições com “culturas próprias” e significados diferentes para diferentes alunos. A escola e a sala de aula são um “lugar imaginário” muito além do espaço real de cadeiras, classes e salas. Ela é aquilo que o aluno percebe a partir de sua história, seus desejos e medos. Na escola acontece um interjogo de forças inconscientes que se cruzam, se opõe, entram em conflito e se reforçam através de situações manifestas (claras e evidentes), ou de forma oculta, latente e inconsciente – e nem por isso – menos significativas. Cria-se uma dinâmica (comportamento grupal) próprio daquela escola. É a Identidade Escolar” (= Identidade Familiar).

Algumas escolas tem seu processo educacional mais dirigido, com limites mais estreitos. Ao contrário de outras, mais liberais e abertas. É o que chamamos de filosofia escolar.

As escolas tem um “currículo manifesto” e “currículo oculto”, ou seja, aquilo que é manifestamente dito e/ou escrito, e a verdadeira prática do cotidiano escolar e da sala de aula.

A escola é constituída por pessoas – professores, diretores, orientadores, funcionários, pais alunos – que lidam de maneiras diferentes com os mesmos fatos. Alguns lidam bem ou mal, conforme as circunstâncias.

Qualquer manual de educação moderna aponta para a necessidade de respeitar as características individuais dos alunos, entretanto na prática, vê-se um ensino massificado em grandes escolas, com turmas grandes, mais ao estilo de uma linha de montagem. Como exemplo, observa-se a dificuldade que professores e escolas tem de reprovar um aluno quando este não conseguiu dominar quantidade X de conhecimento em tempo Y, e acabam projetando na família ou no próprio aluno, sua dificuldade em aceitar a reprovação do aluno, sentindo sua incapacidade de ensinar como uma ferida narcisista.

É importante que tanto pais quanto professores saibam, que dentro de uma visão psicodinâmica, os professores serão recipientes de impulsos, ansiedades, fantasias, emoções, paixões, pensamentos – mais ou menos conscientes – que crianças e adolescentes tem em relação aos próprios pais. Amor e agressividade, originalmente, dirigidos aos pais são transferidos (ou projetados) para os professores. E não são apenas os sentimentos agressivos que serão transferidos, os amorosos também. Muitas dificuldades escolares se organizam em torno destas projeções.

É interessante lembrar também, que trabalhar com crianças e adolescentes, desperta aspectos infantis e adolescentes nos próprios adultos. Professores podem desenvolver sentimentos por determinada criança ou adolescente, que lhe evoque situações de vida (memórias, fantasias, sentimentos infantis ou adolescentes) vividas em etapas do seu próprio desenvolvimento.

A escola serve como simulador de vida, onde existem regras a ser seguidas, mas que podem ser transgredidas sem sofrer as consequências impostas pela sociedade, e ser esta a oportunidade de aprender com a transgressão.

Além do aprendizado, a escola tem função de socialização. Em busca de sua identidade, o jovem encontra na escola um sistema de forças que atuam sobre ele – reedita seu ciúme fraterno, compete, divide, rivaliza, oprime e é oprimido – ou seja, ele reproduz dentro da escola o sistema social e familiar onde vive.

Muitas vezes a família e a escola dissociam suas funções. É frequente pais criticarem a escola, projetando nela todos os aspectos negativos do ensino-aprendizagem, como também a conduta dos filhos. A escola também dissocia, projetando nos pais todas suas incompetências (falta de limites, participação, etc).

É fundamental que família e escola se aliem e se tornem parceiras no desenvolvimento global de seus membros.

Escola, família e sociedade atuam em conjunto no processo educacional. A visão espacial é considerar a escola como o meio do caminho entre a família e a sociedade, quase um espaço de transicionalidade (Winnicott); não é mais o conhecido e protegido “espaço familiar” nem tampouco o temido e desejado “mundo adulto”.

A escola é o lugar onde a criança e o adolescente exercitam seus passos em direção à independência, à individuação e à separação do seu grupo original. Evidentemente, também a escola sofre importantes pressões, manifestas ou latentes, tanto da família como da sociedade, pois ambas esperam que a escola cumpra sua função educativa.

Família e Creche – Parceiras na Educação Infantil

Ao longo das últimas décadas temos presenciado rápidas e intensas transformações em nossa sociedade, com importantes mudanças nas funções e relações dentro da família. Como resultado, temos visto o crescente ingresso da mulher no mercado de trabalho. Este fato decorre basicamente da necessidade da mulher contribuir para o sustento financeiro da família, além de propiciar gratificação e realização profissional à mulher, o que acontece, em parte, devido aos novos valores de igualdade entre homens e mulheres.

Paralelas e totalmente ligadas as estas transformações, ocorreram mudanças na família, como a diminuição do número de membros, maior distanciamento físico e psicológico com a família extensa, além de um crescente número de famílias encabeçadas por um único elemento (pai/mãe solteiro ou pais separados). A saída da mulher/mãe para trabalhar fora de casa associada a uma menor rede de apoio, tem levado a família a procurar soluções alternativas e complementares ao cuidado e educação dos filhos, tanto no ambiente doméstico (avós, empregadas, babás), como em instituições (escolinhas, berçários e creches).

Todos sabemos da importância que tem o vínculo e a relação mãe/bebê para o desenvolvimento físico/psíquico/emocional da criança.

Muitos criticam a atitude feminina de deixar seus filhos pequenos ao cuidado de parentes, empregados ou creches, alegando falta de competência materna, egoísmo , até mesmo falta de amor pelo filho. Apesar desta atitude não ser mais tão frequente em virtude da situação econômica e social atual, muitas mulheres sentem-se culpadas e angustiadas e incapazes de educar seus filhos. Passam a delegar para os outros esta função. Em meio à ambivalência e angústia da mãe, em querer ficar e não poder ficar, o relacionamento com o agente substituto pode se tornar difícil, podendo repercutir no comportamento da criança. Ou seja, a mãe pode e deve exigir que seu filho seja cuidado com todo zelo, carinho e atenção. No entanto, ninguém poderá substituir o papel de pai e mãe na educação e formação do próprio filho.

A família exerce um papel importantíssimo no processo educacional, pois é dentro da família que a criança aprende o mundo. Os pais são os primeiros professores dos filhos. Quando a criança vai para a escola, a família espera que a escola cumpra com as funções de educação, socialização e conhecimento. Funções estas – iniciadas com a criança – pela própria família, tão logo a criança ingresse no meio familiar. A função de educar é tanto da escola como da família.

Qual a função da creche neste processo?

Se olharmos para o passado, veremos que a creche inicialmente cumpria uma função mais assistencialista (cuidar dos filhos enquanto os pais estavam trabalhando), passou a ser um local de promoção de saúde e alimentação para as crianças de famílias mais pobres. Atualmente, a creche passou a ser concebida como uma instituição que atua em parceria com os pais e compartilha com eles a responsabilidade pela educação e cuidado integral das crianças.

A creche/pré-escola não são o Hall de Entrada da Escola, mas sim parte do processo de aprender. O período da creche e da pré-escola é um período de aprendizagem e não apenas um período em que precisamos de alguém para se ocupar e cuidar dos nossos filhos. É importante que os pais tenham com a creche e suas educadoras uma relação aberta e boa, onde haja diálogo sobre o dia a dia das crianças, e onde os pais possam demonstrar atenção e respeito com a criança e a educadora. É importante que os pais saibam o que acontece com seus filhos durante o dia na creche, que conheçam o funcionamento da mesma, qual a metodologia aplicada, se a creche é liberal ou não, pois família e creche devem apontar na mesma direção. Não adianta a creche ensinar limites, ordem, noções de higiene, se ao chegar em casa, os pais – por se sentirem culpados pelo pouco tempo que tem com seus filhos – toleram e permitem que estes façam tudo o que querem. Esta postura confunde a criança e atrapalha o processo de aprendizagem, além de gerar conflitos entre pais/criança/creche.

Muitos dos problemas de aprendizagem que acontecem na primeira série poderiam ser evitados se pais e pré-escola realizassem juntos um trabalho preventivo e de orientação. A creche e a pré-escola são tão importantes no processo de aprendizado global das crianças como o é a escola de primeiro e segundo graus, porque as primeiras dão a base para o restante da construção do aprendizado e do conhecimento.

Podemos e devemos contar com a ajuda da escola, pré-escola e creche, mas em momento algum, delegar ou terceirizar para estas instituições a função de educar nossos filhos. Esta é função e obrigação dos pais.

A família e seu papel na sociedade atual

A menor unidade da sociedade é a família. Ela é fundamental para a formação do ser humano, cumprindo duas funções básicas:

  1. Garantir a sobrevivência da espécie, através da proteção psicossocial (alimento, afeto, moradia, vestimenta);
  2. Transmitir o legado e cultura familiar, promovendo a formação da identidade da criança, através da aprendizagem e comunicação familiar.

Identidade não é a mesma coisa que personalidade. Pode-se pensar em termos de Identidade Familiar. Como em qualquer organização social, também na família existem regras, politicas e padrões de funcionamento. Nem sempre estas regras são verbalizadas ou estão claras. Muitas vezes estão encobertas, e nem por isso, menos presentes. Pode-se transmitir muitas informações mesmo sem abrir a boca. Nosso silêncio pode ser tão importante quanto nossas palavras, pois pode transmitir a ideia de desinteresse, apatia, falta de amor, desinformação. Nossos comportamentos, pensamentos e atitudes transmitem nossas crenças e valores: assim, pais que batem nos filhos, mostram a legitimidade da violência e agressividade; pais que mentem, autorizam o filho a mentir. Chamamos a isso de Linguagem ou Comunicação Familiar. Ela se inicia tão logo entramos na família, o que se dá via nascimento, casamento ou adoção. A criança faz seu primeiro contato com o mundo através da família, primeiramente, através da mãe. Quem transmite `a criança como é feita a interação com o meio externo são os pais, são eles os modelos a serem seguidos, copiados e imitados vida afora. Sua forma de agir, pensar e viver são introjetados como corretos. Quando a criança sai do meio familiar e ganha o mundo, inicialmente através da escola, noções de limite, respeito e moral já estão presentes, tendo como base o modelo parental. Se em casa ela não aprendeu a respeitar as regras e os limites intrafamiliares, esta dificuldade repetir-se-á mundo afora. Numa família saudável, a separação entre gerações precisa ser bem demarcada e clara: pais e filhos não são iguais em termos de autoridade e responsabilidade. Os pais são a espinha dorsal da família e devem garantir a segurança de seus filhos. Isso não quer dizer dominação. Os filhos necessitam de segurança e proteção, que pais sensatos e seguros transmitem através de uma força, que os pais sabem que tem, eles não precisam provar nem para si próprios nem para o filho. Quando o papel de pais e filhos não está bem definido, café provável que os pais busquem na força física ou psicológica um forma de controle e dominação, para deixar bem claro quem manda em casa. Demonstram sim, insegurança para exercer a paternidade e disputam com os filhos o controle familiar. A família tem sofrido profundas mudanças em sua estrutura, assim como tudo que nos cerca. Nestes últimos 50/60 anos aconteceu uma verdadeira revolução mundial em termos de valores sociais e familiares. Para a família acompanhar estas mudanças precisar ser dinâmica a fim de absorver, evoluir e acompanhar todas as mudanças sociais em curso, como também adequar-se `as inevitáveis mudanças do ciclo vital porque passam todas as famílias. Convém fazer um parêntese com relação `as mudanças pelas quais a família passou ao longo da historia da humanidade. No decorrer dos séculos, o casamento era um acontecimento familiar com conotação comercial (o casamento era um negócio). Por volta do século XVIII , aproximadamente 85% das famílias vivia no campo e era o centro da produção econômica: era ela quem produzia quase tudo que consumia (crianças, adultos e velhos dividiam tarefas e trabalho). A criança era vista como um adulto em miniatura. Assim, todos os membros representavam mais um ativo do que um passivo econômico. O trabalho familiar acontecia no próprio recinto ou imediações da propriedade e vizinhança, criando uma convivência próxima. Nesta época quanto mais numerosa a prole, maior a produção econômica (não necessariamente a riqueza), maior a garantia de sobrevivência. Nesta época, não era a família que vivia e trabalhava para seus membros, principalmente em função das crianças, mas ao contrario, todos os membros viviam em função do grupo familiar, que protegia seus membros contra os riscos da existência. Como a família era vista como uma empresa, separação e divorcio não existiam, seria o rompimento desta empresa. Com a industrialização e a urbanização, a família evolui gradativamente, ate os modelos atuais. Vemos hoje, filhos sob a responsabilidade da sociedade, decorrente da desestrutura familiar. No ciclo vital de qualquer família vários são os momentos de crise que podem desestabilizar a homeostase (equilíbrio) familiar: nascimentos, casamentos, morte, divorcio, doença, desemprego … Algumas famílias conseguem crescer, se readaptar e unirem-se cada vez mais. Outras adoecem, focalizando a acentuando o problema, estagnando seu desenvolvimento. O que determina a saúde familiar não é a presença de crises (tidas como normais e necessárias para o amadurecimento familiar), mas sim, a intensidade, rigidez, o momento em que o sintoma aparece. Desestabilizada, a família se utiliza de recursos para recuperar o equilíbrio. Um destes recursos é a sintomatização de um dos seus membros (por serem mais frágeis, adolescentes e/ou crianças podem apresentar sintomatologia como dificuldade de aprendizagem, distúrbio de conduta, etcetcetc). Vale um novo parêntese com relação `a adolescência: o processo em si data de aproximadamente 100 anos, mais precisamente, depois da Primeira Guerra Mundial (1915). Segundo alguns estudiosos, os soldados começaram a se aperceber como uma classe distinta e explorada. Mantiveram esta distinção e rebelião como forma de auto diferenciação protegida, uma maneira de se distanciarem da geração mais velha que estava no controle. Portanto, a adolescência surgiu para satisfazer uma necessidade. Ela é a criação de mecanismos sociais, operando na nossa cultura, e não pode ser considerada fora do contexto social: na época das vovós, gravidez na adolescência X ocupação, geração canguru, etcetcetc. Cada vez mais, os problemas emocionais infantis e adolescentes, são tratados no âmbito familiar, pois é na família que o individuo interage, dando e recebendo influências. Nem todos os problemas emocionais e mentais tem origem na desestrutura familiar, mas importa frisar, que a família pode ser causa, como também, um meio de cura. A criança e/ou o adolescente sintomático não pode ser entendido apenas como vítima da desestrutura familiar. Ela também se beneficia do papel que desempenha nesta família, através dos ganhos secundários (atenção, cuidados, presentes …). Independente de tempo e lugar, a família sempre será de importância capital para a formação do ser humano. Ela vai mudar e se adaptar, vai continuar existindo da forma que for possível, para preservar e manter a espécie humana.

Sobre Famílias

Desde os mais remotos tempos, o homem sobrevive em grupos para suprir as necessidades básicas de seus membros. Exemplo da criança que necessita de uma figura materna para alimentá-la, protegê-la, ensiná-la. Durante milênios, a mulher dependeu do homem, principalmente por causa da sua força física. No período pré-histórico, ela dependia da caça que só o homem conseguia prover. Depois veio a colheita com arado, e durante toda antiguidade, a mulher foi dependente, por não ter condições de sobreviver no período de gestacional, parto e pós-parto. A Revolução Industrial, que desencadeou todos os progressos e facilidades que conhecemos hoje (energia elétrica, máquinas a vapor, eletrodomésticos, etc.) criou uma indústria moderna em que a força física já não é mais tão necessária. A mulher contemporânea pode manter-se e manter seus filhos.

Mesmo assim, é condição inata da espécie humana viver em grupos/sociedades. A menor unidade da sociedade é a família, entendida como o conjunto de ascendentes, descendentes colaterais e afins de uma linhagem, podendo ser do mesmo sangue e vivendo ou não, em conjunto. No decorrer dos séculos, a família sofreu profundas mudanças estruturais. No Ocidente, esta guinada começou a partir da década de 60, com a descoberta dos anticoncepcionais e da maior liberdade sexual e emancipação feminina. Surge o divórcio no Brasil em 1977. Com a separação do casal, a família se divide, novas famílias são formadas, onde os pais e os filhos de pais separados formam novas famílias. Modificações que levaram a uma extraordinária mudança de valores morais. Mas, a estrutura familiar se manteve, mesmo que alterada. É dela a função de proteção psicossocial, acomodação e transmissão cultural a seus membros. É ela a matriz da identidade, que modela e programa o comportamento e a identidade da criança. Para sobreviver, a família muda e se adapta na medida em que a sociedade muda. Por exemplo: ambos os pais trabalham fora, idosos são acomodados em asilos, as crianças em creches. São exigências familiares da sociedade atual.

Quando se pensa em famílias deve-se ter em mente que ela é um sistema sócio-cultural aberto e em constante transformação, necessária para a superação dos diversos pontos de estresses familiares, na transição do ciclo de vida. Exemplos:

            – saindo de casa – jovens solteiros

            – o casamento – novo casal

            – o nascimento dos filhos – ser pai/mãe

            – famílias com adolescentes

            – lançando os filhos e seguindo em frente

            – famílias no estágio tardio da vida

            – entrada (nascimento, adoção, casamento) e saída (somente a morte) dos membros

            – divórcio, doenças, desemprego, idiossincrasias, etc.

Para dar conta de todas estas transformações, a família se adapta às circunstâncias, modificando-se para manter a continuidade do desenvolvimento psicossocial de cada membro. Se a família não se adapta, disfunções se instalam.

A família é um sistema que opera através de padrões transacionais. Transações repetidas estabelecem padrões de como, quando e com quem se relacionar. Estes padrões reforçam o sistema, regulam o comportamento dos membros da família. O sistema familiar se diferencia através de subsistemas. Cada indivíduo forma um ou mais subsistemas familiares que podem ser provenientes de geração,sexo, interesse ou função. Exemplo: esposo/esposa, mãe/filho. Cada indivíduo pode pertencer a diferentes subsistemas, com níveis de poder e habilidades diferenciadas. Um homem pode ser filho, sobrinho, pai, marido, irmão, etc. Em cada subsistema ele deveria se relacionar de acordo com sua função, ou seja, filho age como filho, pai age como pai.

Relacionamentos exigem fronteiras. Elas são as regras que definem quem e como participa. Exemplo: a fronteira de um subsistema parental é definida quando a mãe diz ao filho mais velho “Você não é pai do seu irmão. Se ele estiver andando de bicicleta na avenida, diga-me, que eu o farei parar.” A função das fronteiras é proteger a diferenciação dos sistemas, pois cada subsistema familiar tem funções específicas.

Existem três tipos de fronteiras:

  1. Fronteira nítida que é a ideal;
  2. Fronteira difusa ou emaranhada;
  3. Fronteira rígida ou desligada.

Para o funcionamento adequado da família as fronteiras dos subsistemas devem ser nítidas. Exemplo: um sistema parental envolvendo avó e neto pode funcionar muito bem, desde que as linhas de responsabilidade e autoridade sejam nitidamente delineadas. No caso de famílias com fronteiras difusas pode-se dar o exemplo da família em que todo mundo manda, ninguém obedece, todo mundo é convidado a se intrometer em tudo… Nas famílias com fronteiras rígidas, a comunicação e o relacionamento são difíceis. Exemplo: a criação dos filhos a moda antiga. Quando a família funciona nos extremos fronteiriços (fronteiras difusa ou rígida) a família pode desenvolver patologias e o terapeuta – quando solicitado – terá de reorganizar as fronteiras.

O Subsistema Conjugal – refere-se ao casal que se une com o propósito de formar uma família. Ambos colaboram com aspectos positivos e negativos. O casamento deveria ser uma troca em que homem e mulher entram e selecionam sua própria história e bagagem familiar (cultura, crenças, mitos, valores) e definem o que fará parte de sua vida conjugal. Diz-se que “para casar é preciso primeiro se separar”, dos pais e do modelo familiar anterior ao casamento, para poderem criar seu próprio modelo familiar. O casamento não é apenas a soma de duas pessoas. É o casamento de duas famílias. O casal deve aprender e formar fronteiras que o proteja dos outros subsistemas, criando um território psicossocial próprio, no qual possam dar apoio emocional um ao outro. O tipo de fronteira adotado é muito importante, pois, fronteiras rígidas podem distanciar este casal dos outros, ficando isolados; se criarem fronteiras difusas ou frouxas, outros subgrupos, como filhos e parentes afins, podem se intrometer na vida conjugal.

O Subsistema Parental – Com o nascimento do primeiro filho um novo nível de formação familiar é atingido. O subsistema conjugal deve se diferenciar para abrigar e atender ao filho, sem perder suas características de casal. Alguns casais se entendem bem a dois, mas não conseguem êxito quando o grupo se amplia para 3, 4, ou mais membros. Em algumas famílias, o filho acaba invadindo o subsistema conjugal. À medida que a criança cresce e suas exigências emocionais aumentam, novos arranjos e mudanças pressionam o subsistema parental. A paternidade é um processo difícil. Ninguém o desempenha a seu inteiro contento e ninguém o atravessa sem problemas, erros e acertos. Ser pai é aprender durante a vida, para e com os filhos. A paternidade sempre requer o uso de autoridade. É essencial que se entenda que para os pais educarem seus filhos, é necessário que eles possam proteger e guiar. Os filhos não podem crescer e se tornarem individualizados, se não puderem rejeitar e atacar. O funcionamento eficiente requer que pais e filhos aceitem o fato de que o uso diferenciado de autoridade é um ingrediente necessário para o subsistema parental. Este se torna o laboratório do treinamento social para as crianças aprenderem como negociar em situações de poder desigual.

O Subsistema Fraternal – No mundo dos irmãos, as crianças aprendem a negociar, competir e cooperar. A importância deste subsistema é observado claramente quando ele não existe. Exemplo: filhos únicos que se acomodam ao mundo dos adultos demonstrando desenvolvimento precoce, podendo apresentar dificuldades no desenvolvimento de sua autonomia (tornando-se inseguros) e na capacidade de compartilhar, competir e cooperar com os outros. As crianças, à medida que crescem, vão tendo necessidades diferentes, o que deveria ser respeitado e apoiado. Estimular a autonomia dos filhos não é minimizar os direitos dos pais.

Família e adaptação – A família é sujeita à pressão interna e externa. O estresse no sistema familiar pode provir, basicamente, de quatro fontes:

1. Contato estressante de um membro com forças extrafamiliares. Exemplo: um marido que está sob stress no trabalho, chega em casa e briga com a esposa, que pode revidar a briga ou acomodá-la; também pode brigar com os filhos, ou pode ir para a bodega beber até se tornar alcoólatra, ou pode arranjar uma amante mais compreensiva que sua mulher.

2. Contato estressante de toda família com forças extrafamiliares. Exemplo: depressão econômica. Mudança de residência, de poder aquisitivo. Os estrangeiros que devem se adaptar a um novo país;

3. Estresses em pontos de transição na família: existem muitas fases na evolução natural da família que exigem a negociação de novas normas familiares. Novos subsistemas devem aparecer e novas linhas de diferenciação adotadas. Neste processo, surgem conflitos que podem ser resolvidos por negociações e a família se adapta com sucesso. Exemplo: mudanças evolutivas dos próprios membros da família (adolescência) e por mudanças na formação familiar (via entradas e saídas).

4. Estresses em torno de problemas idiossincráticos: situações anormais que levam a família a reagir. Exemplo: um filho deficiente, gravidez na adolescência, doenças incuráveis. A forma de reação familiar pode definir entre a saúde ou a doença familiar.

Família e Solidão

Uma das funções da família é dar a seus membros um sentido de individualidade. A experiência humana de identidade possui dois pontos importantes: um sentido de pertencer e um sentido de poder ser/estar separado. Quando pensamos no sentido de pertencer a um grupo familiar, pensamos que é condição humana estar inserido num grupo para garantir a sobrevivência e a perpetuação da espécie. As formas de ingressar e existir dentro do grupo familiar podem ocorrer através do nascimento, casamento ou adoção. É neste grupo que encontramos nossa história passada e vivida, costumes, mitos, padrões de funcionamento, linguagem e políticas próprias, que chamamos de bagagem familiar. Toda família se forma a partir de um sistema que se decompõe em vários subsistemas: conjugal, paternal, maternal, filial, fraternal. Estes subsistemas podem englobar várias gerações, fazendo com que cada membro grupo – de uma maneira ou outra – esteja sempre ligado a alguém. Os relacionamentos formados intra e inter membros/grupos, refletem a relação primária dos seres humanos: a relação entre a criança e a mãe ou mãe substituta. A base desta relação está no modo como a mãe se liga à criança, e o modo como isto acontece tem a ver com a própria bagagem familiar materna. Esta vivência pode acontecer de diferentes maneiras: uma delas pode reproduzir a relação simbiótica, onde a mãe vê no filho uma extensão do próprio EU, onde tudo o que o bebê faz, é visto como seu. Não há diferenciação entre mãe/filho. Pode também acontecer o oposto: a mãe não consegue se ligar ao filho, nem perceber suas necessidades. A diferenciação é extrema. Nem mãe, nem criança, conseguem se vincular, instalando-se o isolamento na relação primária. Independente do tipo de vivência que a mãe tenha com a criança, a presença do pai é fundamental, pois é ele quem trará para a relação, sua própria bagagem familiar, podendo servir de ponto de equilíbrio. As diferentes formas de relacionamentos familiares servem de modelo, pano de fundo para futuros relacionamentos. Assim, podemos viver numa casa sentindo-nos  pertencentes ao grupo familiar, ou ao contrário, nos sentindo sós e isolados.

A distinção entre o estado de solidão e a capacidade de estar só é importante.

O estado de solidão se caracteriza pela presença de sofrimento, angústia, ansiedade. É quando nos sentimos à margem do nosso grupo familiar, isolados, não compreendidos, não aceitos. Esta dificuldade no relacionamento pode ser individual ou própria do grupo familiar. Já “a capacidade de estar só” é alcançada com a maturidade emocional, quando desenvolvemos “a capacidade de ouvir a si mesmo”. É quando nos é permitido e nos permitimos estar com nossos pensamentos e sentimentos, independente do grupo familiar.

No nosso dia-a-dia, quantas vezes estamos sós porque queremos, ou estamos sós, por não termos outra opção?

Ambas são formas de estar no mundo. E ambas são necessárias para o desenvolvimento humano.

A família como estimuladora da aprendizagem

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A família é parte de um contexto amplo, moldada pela sociedade e pelo legado familiar. Ela cumpre com duas funções básicas:

– Garantir a sobrevivência (proteção psicossocial, afeto, carinho, comida, casa, vestimenta, etc.);

– Transmitir o legado familiar (crenças, costumes, tradições, etc.) Famílias de médicos, traficantes, professores, etc.

Como em qualquer organização social, também na família existem regras, políticas e padrões de funcionamento. Nem sempre claras e verbalizadas. O silêncio diz muito. Nossos comportamentos, pensamentos e atitudes transmitem crenças e valores: valor do ensino, transmissão da violência, mentiras, racismo, etc. É a chamada linguagem familiar, que se inicia tão logo ingressamos na família. O que acontece por nascimento, adoção ou casamento. A interação inicial com o mundo é feita através da mãe, depois pela família. A forma de agir, pensar e viver são introjetados como certos, copiados e repetidos. A criança se adapta ao funcionamento familiar assim como a família se adapta à sociedade na qual está inserida, flexibilizando-se para acomodar mudanças sociais (telefone celular, internet, questionamento de autoridade, etc.) e mudanças inerentes ao ciclo vital familiar e pessoal. Quando a criança sai do meio familiar e ganha o mundo, inicialmente através da escola, noções de limites, regras, respeito e moral já estão introjetadas. Se em casa ela não aprendeu estas noções , esta dificuldade repetir-se-á fora de casa. Quanto mais claras e explícitas forem as regras, mais fácil a educação e as relações intra e inter familiares.

Cada família é única. Pais e filhos não são iguais em termos de autoridade e responsabilidade. Quando o papel dos pais não está bem definido, é provável que busquem na força física ou psicológica uma forma de controle e dominação, para deixar bem claro quem manda em casa, demonstrando assim, insegurança para exercer a paternidade, disputando com os filhos o controle e poder familiar. Continuar lendo “A família como estimuladora da aprendizagem”

A importância dos modelos

Toda e qualquer família tem suas regras, políticas e padrões de funcionamento, que nem sempre são verbalizadas. Muitas vezes dizemos mais com o silêncio do que com as palavras. Assim também, comportamentos, atitudes, valores, princípios e crenças transmitem melhor o que acreditamos formando a linguagem e/ou a comunicação familiar.
Quando vemos uma criança mentindo, batendo, falando palavrões – além das influências sociais que ela recebe através dos amigos, meios de comunicação e da sociedade em si – uma parte significativa destes comportamentos foi assimilada pela comunicação familiar, através dos modelos parentais. Pais (entenda-se pai e/ou mãe) servem de modelos a vida toda. Aquilo que dizem e fazem soa como o correto, como lei. Então, quando estes usam de violência para mostrar autoridade e poder, demonstram que a violência é legítima. Perpetuam assim, a violência através da comunicação familiar. Outros comportamentos, atitudes e crenças são transmitidos desta forma: racismo, mentiras, palavrões, desrespeito ao próximo, suborno, ressentimentos, etc.Naturalmente, é desta forma que também transmitimos valores e comportamentos positivos: honestidade, generosidade, perdão, trabalho, amizade, gosto pela leitura, etc.

“Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço” não funciona. A ação é mais verdadeira e influencia mais que o discurso.