Minha jabuticabeira

Em 1995 plantei uma jabuticabeira. Era pra ser do tipo híbrida e dar jabuticabinhas pretas e doces em dois, três anos, no máximo. Passaram-se dezenove anos, e entre ameaças, podas, pregos, facadas e machadadas, surgiram timidamente algumas bolotas pretas e açucaradas. De galho em galho, os penachos brancos em forma de flor foram-se abancando e se apossando de todos os galhos e espocando frutos suculentos e encorpados.

flor de jabuticaba

De pouco em pouco, toda a jabuticabeira frutificou e enterrou de vez a teoria de que era uma árvore macho estéril. Ela era apenas um tipo especial, comum e natural. Histérica, talvez. Ao longo dos anos, ela tornou-se sobrevivente apenas por servir de cerca viva para os olhares indiscretos sobre a seminudez permitida na piscina, da qual era a única testemunha. E agora, às vésperas de me mudar com mala, cuia e uma casa inteirinha, surgiu a dúvida: o que fazer com a jabuticabeira? Deixá-la como cerca viva frutífera para os novos moradores se banquetearem, plantar outra e esperar outros dezenove anos – e, se tudo der certo, lá pelos setenta anos, enfim, eu poder me banquetear com os frutos suculentos da nova jabuticabeira especial? Esta foi a primeira hipótese. A outra é radicalizar: cavocar e desenterrar com cuidado as raízes, remover a árvore com guindaste, acomodar num tanque adequado, tratar com substratos, adubos e vitaminas, carregar num caminhão, transportar e replantá-la a 600 Km de onde ela cresceu e tornou-se uma adulta reprodutiva. Certamente ela terá um período de adaptação, pode desfolhar, entristecer, murchar, secar e até morrer. Conheço bem este processo de adaptação e sei dos riscos. Como dizia minha tia-avó Alzira “não se arranca árvore velha do lugar onde ela criou raízes e replanta em lugar novo, senão ela morre.” Ou, ela pode se adaptar e ser minha companheira até o fim da minha vida, porque ela vai viver mais do que eu. Dias atrás, vi uma vovó jabuticabeira de 85 anos replantada num condomínio recém implantado, além de palmeiras, coqueiros e tantas outras plantas enormes sendo fincadas em terras estrangeiras o tempo todo. Até imagino o susto da planta com todo este agito. Lendo Rubem Alves me chamou atenção sua opinião sobre plantar árvores: “Amo aqueles que plantam árvores sabendo que não se assentarão à sua sombra. Plantam árvores para dar sombra e frutos àqueles que ainda não nasceram”. Ok. Também amo, mas vou deixar esta parte para o limão siciliano, o ipê amarelo, a bergamoteira, um jardim/pomar inteirinho! Porque, com relação à jabuticabeira, a chance de eu ser odiosa e radicalizar é de 99,99%. A jabuticabeira é minha e vai comigo.

jabuticabeira frutos